Entenda a conexão entre o trauma, os problemas de equilíbrio emocional e a insatisfação sexual

A insatisfação sexual é uma questão que tende a afligir as vítimas de abuso narcisista
No artigo anterior deste blog, “Como regular as emoções negativas”, sugeri técnicas simples para a regulação emocional, algo que comumente revela-se como um desafio para as filhas de mães narcisistas. No presente artigo, exploraremos outra questão que tende a afligir as vítimas de abuso narcisista e que está intrinsicamente relacionada a sua história de trauma e dificuldade de regular as emoções: a insatisfação sexual.
Embora a conexão entre o abuso sexual e o desenvolvimento dos problemas desta ordem seja-nos fácil de ser concebida, associar o trauma causado pelos abusos de natureza psicológica/emocional e a falta de satisfação sexual da vítima não é algo que exploremos com a mesma naturalidade. Comumente se observa, inclusive no ambiente terapêutico, é que a vida sexual do(a) cliente – se lidada na sala de terapia – raramente é examinada sob a perspectiva do trauma, sobretudo quando não está relacionada, essencialmente, a um histórico de abuso sexual. Enquanto que compreendemos o impacto negativo que o estupro potencialmente cause nas relações sexuais após o evento, é difícil imaginar como ser humilhado e rejeitado por uma mãe tóxica ao longo do desenvolvimento influencia a capacidade de um indivíduo de ter uma vida sexual satisfatória na idade adulta.
A verdade, nua e crua, é que independente da natureza do trauma, todos têm o potencial de causar um grande impacto na qualidade de vida da vítima, inclusive sexual. Abaixo estudaremos os principais fatores que contribuem para este cenário e expõem a conexão entre o trauma, os problemas de controle emocional e a insatisfação sexual.
Alta reatividade
Se você é um leitor assíduo dos artigos publicados no blog do Filhas de Mães Narcisistas, já está ciente de que o cérebro humano, quando exposto a contínuo estresse tal como é característico ao se crescer sob a tirania de uma mãe narcisista, apresenta duas características centrais:
- Alta sensibilidade do sistema límbico ou região do medo
- Baixa atividade do córtex cerebral ou região do pensamento analítico e objetivo
Em vista disso, a carga emocional das vítimas do trauma do desenvolvimento tende a ser demasiado pesada, pois sofrem de estresse crônico e se abalam emocionalmente com facilidade, o que torna difícil levar a vida de forma leve. Portanto, sentir-se bem, relaxada e disposta para ter relações sexuais pode equivaler-se, literalmente, a um grande esforço. Um estudo com gêmeos realizado por Harris et al. (2008) confirmou esta tendência quando demonstrou que aqueles que se descreveram como ansiosos e emocionalmente instáveis, ansiosos, ou que se perturbam com facilidade, são menos propensos a atingir o orgasmo regularmente do que aqueles que se consideraram mais estáveis emocionalmente. De fato, faz sentido concordar com Barlow et al. (2002) ao afirmarem que a ansiedade e o alto nível de estresse impedem a excitação sexual, já que divergem o foco dos estímulos sexuais.
Estilo de apego inseguro
As filhas de mãe narcisistas apresentam um estilo de apego ou vínculo inseguro no contexto relacional, ou seja, nutrem um profundo medo de confiar nas outras pessoas e serem abusadas e rejeitadas novamente. Esta inclinação, por mais que seja automática e inconsciente, cria imensas barreiras à intimidade, à saúde de sua vida sexual e ao sucesso de relacionamentos, em especial os amorosos. Quem não se sente segura também dentro da própria pele nem possui as ferramentas saudáveis para lidar com a inadequação, acaba se distanciando das emoções e do próprio corpo como uma medida (falha) de “regulação emocional”. Quando você negligencia o corpo e as emoções, a sua autoestima vai para o fundo do poço. Nestes contextos, você se esquiva de ter relações e concentra-se exclusivamente nas necessidades do(a) parceiro(a), o que reduz ainda mais a sua satisfação sexual não somente a curto, mas também a longo prazo.
A conexão entre o trauma, os problemas de equilíbrio emocional e a insatisfação sexual faz-se clara quando analisamos os efeitos no cérebro e corpo da vítima de forma holística. Se você está insatisfeita com a sua capacidade de regular as emoções e a qualidade da sua vida sexual, é vital que invista tempo e energia para curar as feridas do seu trauma e aprenda a controlar o estresse ativamente, já que nunca é tarde para se dedicar a medidas de melhoramento de qualidade de vida e dos relacionamentos.
Referências
Harris J.M., Cherkas L.F., Kato B.S., Heiman J.R. & Spector T.D. (2008). Normal variations in personality are associated with coital orgasmic infrequency in heterosexual women: A population-based study. Journal of Sexual Medicine, 5, 1177–1183.
Barlow, D. H., Wiegel, M. & Scepkowski, L. A. (2002). Cognitive-Affective Processes in Sexual Arousal and Sexual Dysfunction. Boston, MA: Markus and Boston University.