A ilusão de conexão na família disfuncional: a “união” através da culpa
Para quem pertence a um sistema familiar disfuncional ou tóxico, é comum sentir-se impotente, sentir que não é visto, ouvido e percebido, como explico no meu novo livro Descontruíndo a família disfuncional. Enquanto pais maduros emocionalmente cultivam uma dinâmica de consciência e inclusão, monitorando, também, o próprio comportamento para que os filhos se sintam amados e respeitados; nas famílias regidas por um estilo parental negligente e até abusivo, predominam a solidão, a rejeição e o medo de abandono, mas, sobretudo, a culpa. Isso se deve ao fato de que os filhos das famílias disfuncionais são condicionados, desde pequenos, a concentrarem-se nos direitos, nas vontades, nos sentimentos e nas necessidades dos pais, algo que, com o tempo, torna-se o meio ou “moeda” que os concede acesso a alguma forma de aceitação, afeição e validação.

Quanto mais disfuncional for a família, maior a dependência dos filhos da aprovação dos pais e menor a capacidade de desenvolverem um senso próprio autêntico, autoconfiante e de honrarem os limites pessoais. Quando se tornam cientes disto, como ocorreu com Kata[i] de 24 anos, proveniente do Leste Europeu, começam a questionar as motivações de seu comportamento autossabotador. Para esta jovem cliente, ficou claro, de forma surpreendentemente rápida, que grande parte da razão de ainda investir tanto tempo e atenção em quem a tratava com desrespeito e desconsideração originara-se do senso de obrigação, de “ter que” cumprir com todas as expectativas dos pais e, assim, garantir o bem-estar deles e a união relacional. Esta incumbência, incutida na psique dela havia muitos anos, perpetuara a subjugação e, quando ousava agir de forma autônoma – questionando o seu suposto mérito universal – resultava, invariavelmente, em um excruciante sentimento de culpa.
Esta culpa presente não somente em Kata, mas em muitos filhos e filhas de pais abusivos/narcisistas/tóxicos, faz com que…
- Digam sim quando querem dizer não, forçando-os a fazerem algo que não querem
- Sintam-se infantilizados, impotentes, insignificantes e sem voz
- Perpetuem um senso falso de identidade que desemboca em descontentamento pessoal inclusive fora dos relacionamentos familiares
- Confundam o amor e a conexão emocional verdadeiras, livres e recompensadoras com os sentimentos de angústia da culpa, estendendo o processo de vitimização
Para libertar-se da prisão da culpa e de um mindset limitado e medíocre, recomendo questionar os valores rígidos de família que corrompem a sua noção de realidade e do poder de mudar a própria vida. Se necessita de ajuda para fazer este questionamento, recomendo a leitura do meu primeiro livro Prisioneiras do Espelho, Um Guia de Liberdade Pessoal para Filhas de Mães Narcisistas e os meus cursos online A codependência e A dependência emocional.
[i] Nome fantasia para proteger o anonimato da minha cliente