O verdadeiro significado do antagonismo da mãe narcisista
Denise[i], 20 anos, uma de minhas clientes e filha de mãe narcisista, conta como o ego incansável da mãe é fonte de eterna chateação:
“A minha está sempre me enchendo o saco para fazer coisas pra ela. Ela não me pede um favor como uma pessoa normal e de forma delicada, é sempre “Eu preciso que você faça isso pra mim”, como se eu fosse sua assistente de plantão. Nunca pede “Por favor” ou diz “Obrigada” de forma genuína, é como se fosse minha obrigação servi-la. Se eu digo “Não” pela razão que for, ela fica “p” da vida, faz o maior escândalo, fica braba pelo resto do dia e se recusa a falar comigo. A minha mãe tem um hábito superinfantil de se comportar como criança mimada cada vez que suas vontades não são atendidas.
Até recentemente, custava-me recusar um “pedido” dela, sobretudo na frente dos outros. Mas algo mudou. Há dois dias atrás, eu e o Edu (namorado de Denise) estávamos comendo algo na cozinha quando ela já entrou dizendo, “Eu preciso que você fale com aquela sua amiga sobre o desconto que ela prometeu na estética do pai dela, pois tô precisando pintar e cortar o meu cabelo urgente”. Como eu já estava quase saindo e tinha planos para o resto do dia, falei pra ela que iria ligar pra minha amiga no outro dia à noite”. A minha mãe, indignada, disparou “Obrigada!” e saiu da cozinha toda apressada como se eu tivesse me recusado de salvá-la de um iminente enforcamento.

A intransigência da mãe narcisista é difícil de aturar
Em vez de ficar me sentindo culpada e mudar meus planos só para agradá-la, eu resisti. Não sei o que deu em mim e na frente do Edu eu respondi, mais “p” da vida do que ela, “Obrigada, por quê? Se você tem tanta urgência que não pode esperar um dia por um telefonema, pega o telefone e liga você!”, ela, então, rebateu com “Tá bem, já ouvi” (a minha mãe se comunica através de mensagens enigmáticas, se você não conhece o estilo narcisista, “Tá bem, já ouvi” quer dizer “Tá bem, insignificância, entendi que você está ‘tentando’ se autoafirmar”).
Eu achei o máximo o que eu fiz, fiquei tão orgulhosa! Pela primeira vez consegui mostrar pra ela que tenho coragem de dizer não também na frente dos outros. O Edu adorou o meu entusiasmo, pois conhece muito bem a sogra que tem!
No outro dia, eu liguei pra minha amiga e meio sem graça pedi aquele bendito desconto pra minha mãe (eu não gosto de pedir favores). Com o telefone na mão, fui atrás da minha mãe para, então, marcar um horário. A minha mãe me disse que não precisava mais, pois já tinha marcado horário com outro cabelereiro e, é claro, sem me avisar. Eu fiquei com a maior cara de idiota quando descobri e tive de inventar uma estória furada pra minha amiga pra justificar o porquê de ter ligado pra pedir algo de que não preciso. Como sempre, a minha mãe venceu, não somente me fez passar vergonha, mas também deixou bem claro que faz o que quer, na hora que quer.”
Conversando com a Denise a respeito do ocorrido em uma de nossas sessões de terapia, ela rapidamente reconheceu a extensão do papel que o antagonismo exerce na dinâmica de seu relacionamento com sua mãe narcisista. Denise compreendeu que a intransigência da mãe não se trata apenas de uma demonstração de poder (“Aqui quem manda não é você, sou eu. Se você não me obedecer, será punida”), como também um dos veículos narcisistas mais eficientes de invalidação da autonomia e dos limites pessoais de seus objetos de manipulação psicológica. Ao ignorar por completo o desejo da filha, a mãe narcisista ignora a pessoa inteira, fazendo com que esta se sinta destituída de sua própria individualidade, maturidade, identidade, livre-arbítrio e poder de decisão. O antagonismo da mãe narcisista é castrador. É usado, principalmente, para submeter a filha à tirania de seu ego, fazendo-a sentir-se impotente e como se estivesse perpetuamente subjugada a uma suposta força maior. Ver a filha perdida e com a autoconfiança destroçada, como foi o caso no relato de Denise, proporciona a mãe narcisista certa aura de superioridade, sentimento do qual depende para criar uma falsa ilusão de autoestima.
“O que fazer?”, pergunta a filha de mãe narcisista.
Se você convive cotidianamente com uma mãe narcisista e ainda não tem condições de alçar voo solo pela razão que for, passe a colocar o foco da sua atenção nela e não em você. Enquanto ela age de maneira inflexível e obstinada, analise seu comportamento mentalmente fazendo referência à longa lista de atitudes transtornadas narcisistas. Reafirme a sua posição e não ceda a chantagens emocionais, afinal, como dizem os norte-americanos: We don’t negotiate with terrorists (Nós não negociamos com terroristas). Aprenda a colocar os seus limites em prática dizendo “Não!” e reitere as suas vontades pelo número de vezes que se fizer necessário (para dicas de como dizer não a sua mãe narcisista, clique aqui). Embora a sua mãe não mude a tendência antagonista por sua causa, você se sentirá muito mais adulta, autoconfiante e livre.
[i] Nome fantasia para proteger o anonimato de minha cliente