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Você não é a sua mãe narcisista, você está tendo um flashback

Você não é a sua mãe narcisista, você está tendo um flashback

Você tem um flashback quando é lembrada de uma experiência passada

Como filha de mãe narcisista, não é fácil separar-se do abuso sofrido. Isso se deve ao fato de que o trauma do desenvolvimento influencia a sua perspectiva de mundo e autoimagem. Quando você sofre uma série de eventos adversos durante o período de crescimento e desenvolvimento, estes moldam a maneira como você interpreta a informação a sua volta. Isto ocorre porque o seu sistema límbico ou cérebro emocional torna-se hiperativo como resultado de uma longa exposição ao estresse e às ameaças ao seu senso de segurança e bem-estar, você faz senso da sua experiência sob a lente do trauma, ou seja, de forma rápida, automática, emocional, tendenciosa e subjetiva.

Na prática, isso se reflete em atitudes e estados emocionais que seguem a incidência de um flashback. Você o tem quando lembrada de uma experiência passada, seja ou não prazerosa. Os flashbacks são normalmente visuais, fazendo com que se recorde de uma imagem de um evento passado e se sinta bem ou mal, ou puramente emocionais, permitindo que sinta as emoções de uma experiência passada (normalmente traumática), mas sem conseguir identificá-la ou visualizá-la. Esta última modalidade de flashback tende a ser a razão por trás dos episódios de intensa tristeza, raiva e inadequação, por exemplo, que causam angústia nas vidas de filhas de mães narcisistas mesmo quando não haja razão aparente para justificá-la.

Os flashbacks também são responsáveis por manter a memória de sua mãe narcisista presente na sua vida, mesmo depois de ter cortado o contato. Isso acontece, pois tudo que seja semelhante a ela ou ao vivido com ela, como a sua aparência e seu comportamento, por exemplo, pode tornar-se um gatilho. Assim que uma memória em relação a ela é ativada através de um gatilho, a probabilidade de você ter um flashback, visual ou emocional, é grande. Na prática, isso acontece de várias formas, como nos exemplos:

– Você está conversando com uma amiga no telefone e, de repente, faz um comentário usando uma expressão característica de sua mãe narcisista. Ao se dar conta do que disse, sente-se desconfortável, como se fosse, novamente, a criança insegura copiando o estilo de falar da mãe fria e desinteressada em busca de aprovação.

–  Você é mãe e está tendo um dia “daqueles”. Enquanto o seu marido vegeta na frente da televisão, você tenta sem sucesso colocar a roupa no seu filho de dois anos que, na fase do “não!”, torna o processo bem mais lento do que necessário, atrasando-a para o encontro com as amigas. Não conseguindo controlar a irritação, você perde a paciência com ele “da mesma forma que a sua mãe fazia com você”. Assim que nota, sente-se dominada por um terrível sentimento de culpa e fica envergonhada como se uma pequena explosão de raiva fosse o suficiente para defini-la como uma mãe abusiva.

– Você passou um fim de semana completando uma rota gastronômica. A experiência foi incrível, mas o resultado no seu estômago, nem tanto. Indo em direção à máquina de lavar com as roupas sujas tiradas da mala da viagem, você se flagra andando com o cabelo preso em um coque e com a protuberância abdominal para fora da camiseta, tal como a sua mãe narcisista circulava dentro de casa. A projeção e visualização desta imagem lhe causa intensa náusea, como se tivesse se tornado uma com a sua mãe narcisista.

Quando você tem um flashback como os citados, a tendência é pensar em algo do tipo, “Meu Deus, eu sou que nem a minha mãe/estou me tornando a minha mãe” ou indagar, “Será que eu sou narcisista?” e sentir-se extremamente inadequada e impotente. A verdade, contudo, na esmagadora maioria dos casos,  é outra. Somente porque você está se comportando de maneira similar a sua mãe (ou se parecendo fisicamente com ela), não significa que seja ou esteja agindo como ela, mas que, provavelmente, esteja tendo um flashback. Este, por ser carregado de significado emocional, pode distorcer o seu modo de interpretar o que está acontecendo, inclusive quando o que está vivendo no presente não tem nada a ver com o passado a qual foi remetida. Portanto, é importante entender que as observações mentais resultantes de flashbacks só fazem sentido sob a perspectiva do trauma, mas não refletem, necessariamente, o momento atual nem a pessoa que realmente você é. Portanto, fique tranquila: você não é a sua mãe narcisista, você está tendo um flashback.

Para reduzir a incidência de flashbacks e lidar com os demais efeitos do trauma, recomendo buscar uma terapeuta especializada em uma das abordagens terapêuticas do trauma, tal como a EMDR. Além disso, criar um inventário dos seus gatilhos, monitorar os seus humores e criar o hábito de conectá-los às experiências recentes e à ocorrência de flashbacks correspondem a atos simples que lhe ajudam não só no senso de autocontrole e autoeficácia, bem como no autoconhecimento e no processo de autorregulação emocional.

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